Por Dartagnan da Silva
Zanela (*)
O BURACO É MAIS EMBAIXO - A ignorância dos fatos não é suficiente
para explicarmos um erro e, o conhecimento manifesto pelo agente sobre algo, é
tão insuficiente quanto à ignorância para compreendermos uma atitude qualquer,
seja ela estúpida ou não.
Dum jeito ou de outro, o desconhecimento
ou a ciência sobre alguma coisa é apenas uma variável entre inúmeras outras
que, se forem devidamente ponderadas, são menores, bem menores em importância,
que o destempero do caráter manifesto pelo sujeito que comete esse ou aquele deslize.
ENTRE LINHAS TORTAS – Uma derrota, bem como uma vitória num pleito
eleitoreiro são sinais dados pela sociedade que devem ser devidamente lidos
tanto pelos vencedores, como pelos perdedores e, principalmente, por todos os
cidadãos de bem.
Das várias leituras que podem ser
realizadas, juntamente com as inúmeras variáveis que podem e devem ser levadas
em consideração, há dois pontos que não podemos ignorar.
Primeiro: a soberba cega-nos,
como ela deixa-nos obtusos! E, por isso mesmo, a queda, seja ela grande ou
pequena, é um ato de misericórdia para abrirmos os olhos e voltarmos a enxergar
a vida com olhos mais sensatos e com a alma humildemente reclinada frente à
realidade de nossos atos.
Quanto à vitória, bem, essa é um
teste. E que teste! Uma séria provação para averiguarmos de que material é
feita a nossa alma. Exame esse que coloca a vista de todo aquele que tiver
olhos e estômago para ver, a matéria pútrida que há no abismo de nossas
entranhas.
Segundo: o povo, numa democracia,
gosta sim de ser cortejado. Aliás, quem não gosta? Porém, isso não significa
que ele, o tal do povo, seja um bicho bobo. Não mesmo. Bobo é que pensa assim.
Ele, o povo, comete lá suas estripulias, mas não é estulto não. Não mesmo.
Detalhe: com frequência muita gente esquece-se desse fato e acaba pagando caro
por tal esquecimento.
Enfim, de um jeito ou doutro, a
vida, em sua pedagogia, sempre está disposta a nos ensinar a verdade por entre
a tortuosidade dos traços de nossa existência. Sempre. Porém, infelizmente, nós
preferimos muitas vezes ignorar as lições que nos são ministradas por ela e,
soberbamente, acabamos por optar em continuar agindo, pensando e vivendo de
maneira atravessada. Fazer o que, não é mesmo?
OUTRAS LINHAS TORTAS – O mais engraçado ao fim dum pleito eleitoral
são as histórias de campanha. Muitíssimas histórias, uma mais cabeluda que a
outra. Historietas essas que se fossem devidamente escritas engordariam um belo
volume com crônicas e contos que, por sua deixa, serviriam como um poderoso
instrumento para educar as futuras gerações, tanto de cidadãos candidatos como
de cidadãos eleitores.
Com uma obra assim poderíamos
aprender algo de bom com as coisas profundamente ridículas que se fazem
presentes numa eleição e que, diga-se de passagem, não são poucas.
Práticas que revelam o que somos
capazes de fazer em nome do tal do poder; práticas que revelam as sombras que
habitam nossa alma; práticas essas que desvelam as turvas inclinações de nosso
caráter que devem, necessariamente, ser devidamente admoestadas por cada um de
nós em nós.
E O TEMPO NUBLOU – Lembro-me que, certa feita, havia assistido um
episódio do seriado Star Trek onde o senhor Spock e o doutor Mccoy estavam
presos num planeta devido a uma avaria em sua nave e, lá pelas tantas, uma
besta galáctica se aproximou do módulo espacial deles e aí o tempo nublou de
vez.
O vulcano, sem pestanejar,
disparou alguns tiros e argumentou com o doutor Mccoy que, feito isso, a
criatura iria se assustar e fugir. Ledo engano. Ledo e vaidoso engano. A fera,
no frigir dos raios lasers, ficou enfurecida e investiu violentamente contra a
nave e quase os matou.
Ou seja: o senhor Spock, até
então, não havia compreendido que, diante de uma ameaça, uma criatura pode
reagir de muitas formas e que, muitas vezes, tais reações não se enquadram em
nosso raciocínio rasteiro, viciado em esquemas mentais simplórios de causas e
efeitos; raciocínios que, na maioria dos casos, desconsidera as inúmeras
variáveis que podem determinar um efeito que é desencadeado por uma determinada
causa.
Enfim, resumindo o entrevero
estrelar: todo aquele que ameaça, velada ou descaradamente, uma ou mais
pessoas, todo aquele que persegue indivíduos por essa ou por aquela razão,
esquece-se, com muita frequência, que os perseguidos e ameaçados também podem
revidar e, cedo ou tarde, de modo circunspecto, o fazem.
APENAS UMA REFLEXÃO INDOLOR – Goethe nos ensina que devemos tratar
a todos com decência e, tratar o semelhante desse modo, significa que, antes de
tudo, devemos respeitar a inteligência alheia. Bem, é nesse desrespeito que
reside boa parte das indecorosas imposturas de nossa sociedade.
Dum modo geral, a inteligência do
povo é diuturnamente desrespeitada das mais variadas formas possíveis e, de
tempos em tempos, ela é insultada de modo mais que avassalador por todas as
hostes, que juram de pés juntos, serem seus fiéis benfeitores.
Pior! Com o devir dos dias, de
tanto ter sua inteligência aviltada ela pode acabar degenerando na mesma medida
em que é afrontada.
Enfim, não sei se é assim que a
humanidade segue seu rumo, mas, com grande margem de acerto, esse é o ritmo do
passo da brasilidade.
OUTRA REFLEXÃO INDOLOR – Toda e qualquer pretensão democrática,
numa sociedade que não tenha uma forte inclinação aristocrática enraizada no
coração dos cidadãos, está fadada a degenerar numa oclocracia.
NÃO É POR MALDADE – Volver as vistas para a cultura brasileira
contemporânea e não reconhecer o estado deplorável em que a alma verde amarela
se encontra não é ufanismo desvairado não. É doideira pura e simples mesmo.
Digo isso não por maldade. Não é
isso não! De jeito maneira. Mas, consideremos os seguintes dados: nós,
brasileiros, ficamos em 2016 no quinquagésimo oitavo lugar no ranking do PISA
(numa lista de sessenta e cinco países); somos recordistas mundiais em número
homicídios (são ceifadas, por ano no Brasil, mais vidas do que em toda a guerra
do Iraque); somos o país onde as pessoas iniciam a vida sexual mais
precocemente; estamos em primeiríssimo lugar em casos de estupros de
vulneráveis; cresce significativamente nas plagas brasileiras o número de
usuários de drogas lícitas e ilícitas; e, por fim, ostentamos, sem corar de
vergonha, o número cada vez maior de analfabetos funcionais (in)devidamente
diplomados.
Já sei, já sei: é o fim da rosca,
não é mesmo? Pois é. E é por essas e outras que digo e repito, com tristeza no
coração: volver os olhos para a cultura brasileira contemporânea e não
reconhecer o estado decrépito em que a alma brazuca se encontra não é sinal de
patriotismo não. É estupidez pura e simples. Uma prova de desamor por tudo
aquilo de significativo que um dia foi produzido no finado Brasil.
(*)
Professor, cronista e bebedor de café.
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