BLOGICAMENTE FALANDO – parte IV

Por Dartagnan da Silva Zanela (*)

(1)
Não provoque as pessoas de bom coração. Não seja tolo de irar aqueles que têm um coração fortemente inclinado à mansidão porque essas, mais do que todas as outras pessoas, têm adormecidas em seu íntimo um punhado de bestas ferozes que, sinceramente, é melhor que fiquem adormecidas. Por isso, repito: não as provoque. Não mesmo. Não queira ver a transfiguração dessas almas adocicadas feito favos de mel em terríveis cálices de amargo fel.

(2)
Não fique indagando sobre tudo o que está ocorrendo e muito menos sobre o que todos estão fazendo aqui e acolá. Isso, além de ser um trambolho inconveniente, também é um veneno para nossa inteligência porque quem quer saber de tudo, a respeito de tudo e de todos a tempo todo, acaba sabendo nada, sobre nada, em tempo algum. Queiramos ou não, tal disposição indiscreta tem um poder avassalador para desordenar a nossa alma. É por isso que, entre outras coisas, a Santa Madre Igreja condena veementemente o mexerico e a vã curiosidade. Por essas e outras que, como dizem os populares, a indiscrição matou o gato. Se não o matou, com toda certeza, o deixou idiota. Bem idiota.

(3)
Nos sofrimentos humanos, o mais agonizante, é saber que boa parte dos males que nos afligem são frutos de nossas escolhas e, um bom tanto de nossos gemidos, apenas um tolo exagero de nossa imaginação. E escolhemos mal por querermos parecer ser os mais espertos dos espertos. E extrapolamos muito em nossos alaridos dolorosos por seremos tão desfibrados quanto desordenados espiritual e moralmente.

(4)
A misericórdia é uma dádiva divina semeada enquanto possibilidade humana em nosso coração; porém, quando empregada com malícia para dissimular uma altivez inexistente, ao invés dela reparar o mal impingido, ela apenas aprofunda mais e mais o cinismo daqueles que fazem da transgressão e da barbárie um projeto de vida.

(5)
Somente almas tediosas procuram a tal da felicidade nas miudezas do mundo; somente elas fazem dessa vã procura a mais elevada meta a ser perseguida numa vida. Para elas, na verdade, essa seria a única coisa digna de sua destemperada atenção e talvez, por isso, elas sejam como são: vazias.

(6)
A leniência da justiça e a simpatia dos formadores de opinião para com os criminosos, sejam eles miúdos ou graúdos, tem uma força corruptora tão grande quando o próprio crime em si, seja ele vultoso ou minúsculo.

(7)
Lembremos sempre do óbvio ululante. Lembremos sempre que a canalhada jura de pés juntos que eles são bons-moços, de que todo meliante afirma, veementemente, sem fazer figas, que ele é uma alma inocente e injustiçada. Isso é tão óbvio, tão óbvio, que às vezes esquecemos, da mesma forma que não nos lembramos que todo justo, antes de qualquer coisa, considera-se um mísero pecador e que todo cidadão íntegro reconhece-se como sendo um improlífico devedor de seus pares.

(*) professor e cronista.
Site: http://dartagnanzanela.webcindario.com/

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